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15/02/2010
22:12:38 |
DE SECA E ENXURRADA |
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Tremeluz o sol na coxilha,
ameaçando o pasto do Outono.
O campeiro perde o sono,
pedindo que Deus ajude,
que pr'uns dias o tempo mude
e faça cair uma chuva,
pois, se não, o que se muda
é a querência do homem rude.
Se a seca não der uma trégua,
aos poucos o gado definha
e o campeiro se avizinha
dos luzeiros da cidade;
vai camperear dignidade
nos amontoados urbanos,
viver sem nome, orelhano,
vender a força e a idade.
Lá, sim, a seca tá braba!
Nem tem mais o que salvar.
Quando o campeiro chegar
e desemalar os apêros,
embretará um pesadelo
maior que esse do campo;
só sobrará o desencanto,
a fome e o desespero.
Não terá mais o seu pingo,
nem o churrasco na brasa;
o galpão não será casa,
e não terá o chimarrão.
Se um piazito chorão
reclamar da barriguinha,
talvez não tenha a farinha,
pra dar um jeito num pão.
Quando o Sul vestir o poncho,
a chuva já nem lhe importa;
suas raízes estarão mortas
e não mais será um campeiro,
será somente um povoeiro
vivendo, “se Deus quiser”,
levando de tiro a mulher
e a prole de um changueiro.
Se lembrará, com saudade,
das coisas lá da campanha;
vai estancar com uma “caña”
a estiagem de sustento;
construirá apartamentos
pra conseguir os munícios,
e ruminará os resquícios
de recuerdos de outros tempos.
Lá no povo tudo é seca,
da bóia aos sentimentos;
ninguém escuta lamentos
e pouco importa o irmão;
se alguém dá com uma mão,
logo puxa com a outra;
a vida é sempre potra
e o destino é redomão.
Se o sol larga da cisma
de se deitar colorado,
e vai dormir bem tapado
no fim do quarto minguante,
o sonho do retirante
a cada muda se renova!
Se chover na lua nova,
chove nos quartos restantes.
E o campeiro gasta a vida,
pedindo que mude o vento
e um temporal aguachento
traga-lhe a paz e a bonança,
e possa voltar pra estância
com a rebrota do pasto,
recuperar o tempo gasto
campereando a esperança.
Com a chuva vem fartura
de repasto e de quimeras,
e a estância que foi tapera
renasce da chuvarada;
volta o homem pra morada
reaprendendo a sonhar,
e a nunca mais reclamar
da chuva e da enxurrada!
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Autor:
Jorge Claudemir Soares |
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Poesia enviada Por:
Jorge Claudemir Soares - Uruguaiana / RS |
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Observações:
Poesia premiada com o 3º lugar na modalidade Poesia Inédita do Enart 2009.
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