E foi assim que deixei meu pago:
semeando sonhos pra colher saudadesÂ…
…levando ausências de taperas nos olhos
e silêncios de furnas guardados em mim…
......
Nos grotões da alma de quem anda longe,
os rumos perderam seu valor realÂ…
…as léguas do ontem são tênues lampejos
refletindo dores num duro amanhã…
E os sonhos que nascem envoltos em ânsias,
transformam distâncias no pago querido;
e o trote inconstante e sem rumo do tempo
faz pausa na marchaÂ…parece que paraÂ…
Â…nos muitos instantes de recuerdos vivosÂ…
…que a lonjura do meu chão semeou a cuidado
na terra lavrada dos meus sentimentosÂ…
E quinchei dentro dÂ’alma um rancho de esperasÂ…
- santa-fé e torrão que me trouxe um destino -
Â…mesclando o rumo de um andar sem tino
num pensamento que restou refeitoÂ…
O tempoÂ…no rancho transformou taperaÂ…
Do sonhoÂ…restou somente uma nova quimeraÂ…
Â…contrabandeando saudades
pelas fronteiras do peitoÂ…
Só quem não anda não sabe
o que a distância do pago,
de mal, lhe pode fazer:
Â…caminhando pela vidaÂ…
”Boleadeira sem manicla!”
…as léguas ensinam rumos…
demarcam doresÂ…
Â…gastam bastos e caronasÂ…
cansam fletesÂ…
Â…desmancham sonhosÂ…
…dos que vencem as distâncias
enganando as próprias ânsias
pra tentar não mais sofrer.
E o pensamento de quem anda longeÂ…
Â…Ah!Â…o pensamentoÂ…
Â…como a florzita de trevo
que abre na primavera
- tão pura e simples…singela…
…tal é o exemplo que explico…
O pensamento semeia o ouvido
de berros de terneirada de chiqueiro
…na mangueira - de manhã cedo –
esperando pra mamarÂ…
Da festa em latidos
da cachorrada de campo
Â…esperando o pessoal pra camperearÂ…
Dos ringidos de basto e caronaÂ…
Â…convidando a mente
a não pensar em mais nada…
Um longo ronco de mate
amadrinhando solito
as conversas de galpão,
os chiados da cambona
Â…estalar de fogo grande
num cerne de coronilha
Â…dos que aquecem mais a alma
que propriamente a ossamentaÂ…
O pensamento deslumbra os olhos
com sóis vermelhos nascendo
Â…coloreando uma alvoradaÂ…
Um tapete verde - em campo -
de primavera enfloradaÂ…
Uma flor de corticeira
sangrando um céu azulado…
…que uma manhã de setembro
perpetua em luz e cor
num dos tantos retratos
que guardo na almaÂ…
E a estrela Boieira vem de ponteiro
da gadaria da tropa de estrelas da noiteÂ…
…co’a égua madrinha das Três-Marias
batendo cincerroÂ…
Â…e os tambeiros do Cruzeiro de sinueloÂ…
O pensamento relembra
o gosto do pão-de-forno
- das avozinhas campeiras -
…sovados à mão e postos no forno
por alguma pá antiga…
Â…daquelas feitas por algum negro velhoÂ…
Â…do tempo da escravaturaÂ…
O pão feito a fogo e carinho…
…que já não existe mais…
…como o forno e a pá…
…muito menos as avós…
E a dura lida de tropear recuerdos
revive o ontem que se acaba em nós…
…como inútil transição que somos
do que era antes…pra um amanhã…
…que virá após?
E o pensamento reviveÂ…
Â…a changa bagual de correr rumos,
que já não é mais conquistadora
dos meus anseios,
os quais me foram legadosÂ…passadosÂ…
Â…e guardados em mim.
…através dos gens
dos muitos gaúchos-centauros
que formaram o que souÂ…
Os que cortaram o Continente de São Pedro
- afiando adagas e aquecendo o cano das garruchas -
…no tempo em que a força do braço e os pingos buenos
eram a riqueza maior dos gaúchos de lei…
…dos quais viemos…razão do que somos…
Â…dÃzimo que herdamosÂ…
Â…ensinamento a passar adianteÂ…
E a sina de andar longe se denota
num vil caminho de ásperas mazelas…
…ao coração taciturno do que deixou seu pago…
Â…sorvendo os dissabores da saudadeÂ…
- a cada diaÂ…cada horaÂ…cada instante -
Â…cevados num amargo de tristezasÂ…
......
E de tão longe…retomo a estrada…
Â…rumos de mim mesmoÂ…rastros que deixeiÂ…
Â…Ã s vistas do pago que tento encontrarÂ…
Â…colhendo saudades dos sonhos semeadosÂ…
Â…taperas nos olhosÂ…recuerdos guardadosÂ…
Â…lampejos de um ontemÂ…
Â…que vivo a buscarÂ…