Sou um perfil de luzeiro
do sonho de muitas eras,
que um par de amorosas vontades
tornou realidade;
doçura vertida
numa estampa de prenda,
que esta terra vai pintando
nos olhos da alma.
As sementes do homem
são plantadas no corpo e no coração;
e a nossa raça faz pauta,
pra cantar um bem querer.
Sou herdeira das sementes, das flores,
do verde da minha natureza...
e dos frutos maduros
para a sobremesa dos cansaços...
Sou herdeira da cacimba de cores,
que retratam
o meu pago e a minha gente,
na fonte dos olhos e do coração;
das mensagens de acordes,
brotados de um clarim de gaita,
com ponteios de sinuelo
de uma guitarra pampa.
Herdeira dos silêncios
e dos sonhos de vida
de tantos patrÃcios,
e dos ternos sacrifÃcios
que se fazem por amor...
Herdeira das plangências sonoras
dos sedentos de ternura
e da alegria das criaturas,
quando se encontram felizes;
das lendas e dos encantos,
formando a identidade
pra futura geração;
do sentimento de saudade,
matizando um por de sol,
e do clarão de arrebol,
acendendo a inspiração
dos poetas de rebeldia,
na ancestral teimosia,
no rastro do boi barroso.
Herdeira das vigÃlias cansadas,
nas caladas da noite,
quando o açoite do sobressalto
fustiga a imaginação...
ninando uma canção,
para quem tanto se ama...
escutando o vento...
enquanto a lua ruana da estação
descambou no firmamento...
Herdeira da magia
da terra, da água, do sol,
da boieira - olhos de luz –
... infinito sentimento...
da sina de uma raça,
que tem raÃzes, história
e um futuro!
Então, olhe para o infinito
e pinte a pauta do meu grito!
Ouvirás um clarim
e um tropel de cavalo...
verás um gaúcho pilchado,
como um guerreiro farrapo
clamando por liberdade...
E este será meu filho!
O herói da minha alma!
E na minha intuição feminina
afundarei atalhos de desvelos,
nas horas de vigia...
daqueles fins de tarde
que se olha para o horizonte,
atirando o laço do pensamento,
para alguém que partiu
e não voltou...
A prenda herdeira
guarda um fogo de chão,
aceso com os tições
da coragem... no peito...
uma cuia bem cevada
com mate doce,
para a seiva da vida...
e um mate-amargo
para mim mesma,
com as lágrimas fervidas
na cambona dos desenganos
e desventuras.
E assim,
quando o senhor tempo toldar
a trajetória do meu destino,
olhem bem para o poente...
no encontro das duas sesmarias
- formando um mapa -
... verão um mastro se erguendo
à beira da cacimba de aquarelas
e, saindo de dentro dela,
um arco-Ãris... (testamento)
... com as listras
da nossa bandeira farrapa.
Então, a saudade me fará adormecer,
ninando a inocência
da minha bruxinha de carinhos...