
1ª Querência da Poesia Crioula,
De Caxias do Sul-RS
Ilustração: Vasco Machado
Velho pago bendito,
de coxilhas verdejantes,
trilha dos viajantes
dos tropeiros de outrora,
dos retinidos de esporas
de meus ancestrais de dantes.
ResquÃcios que trago nas veias,
rubro sangue de minha gente,
de meus avós e parentes
da porteira do Rio Grande,
onde a beleza se expande
nos campos de Vacaria;
dos rodeios e montarias,
das turumbambas de laços,
dos relinchos e manotaços
de um redomão caborteiro;
dos fandangos galponeiros
e dos contrapontos de gaita;
dos causos, lendas e cantigas
do Negrinho do Pastoreio,
da tropilha que pastorava
para um rico estancieiro,
da madrinha Nossa Senhora,
que o tirou do formigueiro;
do Boitatá, na meia-noite,
cuspindo fogo nas canhadas,
das peleias nas sextas-feiras
do lobisomem com a cachorrada;
das estórias de assombração
das taperas abandonadas;
do bolicho à beira da estrada,
do peão gaudério, teatino,
do berro do boi brasino
e do bugio lá no capão;
da cambona preta chiando,
chorando sobre o tição;
das noites frias de geadas,
do surrupiar dos quatro-ventos,
da mala de poncho nos tentos,
no recavém dos arreios;
do baio mascando freio
e de um mouro pedindo cancha;
dos trastes buenos de encilha,
da sinhazinha parteira;
da Ãndia benzedeira,
do chiru velho curador;
das chilenas cantadeiras
e do petiço marchador;
da costela gorda no espeto,
largando a graxa no braseiro,
do chimarrão hospitaleiro
correndo de mão-em-mão,
da tertúlia da peonada
em roda do fogo de chão;
do galpão de chão batido,
arrodeado de costaneira;
da casculenta chaleira
na culatra do fogão;
do telhado enfumaçado,
e do picumã no oitão.
Na mangueira de tronqueira,
fechada com varejão,
embretei dentro do peito
os versos da tradição,
que repontei da invernada
da minha imaginação!